Partido Comunista Português
Centenas de milhões... mas para o abate de embarcações
Quarta, 16 Julho 2008
pescas_madeira.jpgOs deputados do PCP ao PE tomaram posição relativamente às informações disponíveis sobre as medidas decididas pelo Conselho de Agricultura com vista a reduzir o impacto da crise com que se confronta o sector das pescas na UE.

 

 

Nota do Gabinete de Imprensa dos Deputados do PCP ao PE 

Face às informações disponibilizadas sobre o "acordo político" alcançado no Conselho de Agricultura e Pescas da União Europeia, de 15 de Julho, em relação à "crise económica do sector da pesca", os deputados do PCP no Parlamento Europeu consideram necessário sublinhar que neste são reafirmadas e avançadas propostas que, na sua essência, evidenciam que o seu único e real objectivo é a promoção da destruição de grande parte deste sector económico estratégico, tanto mais, quando não são adoptadas medidas adequadas que dêem resposta às necessidades e aos problemas com que se confronta o sector das pescas. Senão vejamos:

- As propostas até aqui avançadas destinam-se "principalmente a reduzir a sobrecapacidade" de pesca, isto é, ao abate e à redução da capacidade das frotas, num dito "esforço de reestruturação sem precedentes", através da implementação de derrogações ao Fundo Europeu das Pescas (FEP), válidas até final de 2010;

- Reestruturação essa que, aglutinada nos denominados "programas de adaptação da frota" em cada país, tem como um dos "requisitos obrigatórios" a "garantia de uma redução definitiva de, pelo menos, 30% da capacidade da frota de pesca", incentivando-se "os Estados-Membros a alargar os seus regimes de cessação definitiva das actividades". Deste modo, facilita-se o, o "abate parcial" (substituição de uma embarcação por outra de menor capacidade, como incentivo ao abate) e a "cessação temporária" (condicionada à adesão a estes planos de reestruturação); "acesso aos prémios à cessação definitiva"

- O financiamento destas propostas (que a Comissão Europeia estima terem um custo de cerca de 2 mil milhões de euros[1], dos quais cerca de 1,6 mil milhões de euros para a cessação definitiva e temporária), é feito com base na reprogramação do FEP e dos respectivos programas operacionais. Deste modo, canalizam-se verbas essencialmente para financiar o abate e a redução da capacidade de pesca - concentrando-as no eixo 1 (ajustamento da frota pesqueira) nos próximos dois anos - e aumenta-se o co-financiamento (95%) e o pré-financiamento (14%) comunitário no âmbito do FEP;

- Quanto ao anunciado reforço de 600 milhões de euros1 para o sector das pescas, este está condicionado, entre outros aspectos, ao cumprimento do objectivo de reestruturação das frotas por parte de cada Estado-Membro, isto é, à definição e concretização de "programas ambiciosos de adaptação das frotas que envolvam uma percentagem significativa da frota nacional" e à utilização das verbas que cada um destes já dispõe no âmbito do FEP para este fim, assumindo um carácter de reserva para garantir que o plano de abates se concretiza e tenha o máximo alcance possível;

- Quanto ao anunciado aumento das ajudas "de minimis" para o sector das pescas (auxílio de 30 mil euros por embarcação, até um máximo de 100 mil euros por empresa, em três anos), para além da sua implementação estar condicionada à "conformidade com as regras da OMC e às negociações em curso sobre os subsídios ao sector das pescas", a concretizar-se, apenas estaria operacional em 2009, só fazendo sentido se for traduzido num efectivo e imediato apoio ao sector, nomeadamente em Portugal;

- Quanto às "medidas de mercado", já estão, no essencial, contempladas no FEP e na Organização Comum de Mercado dos produtos da pesca, sendo o sistema de monitorização de preços uma das poucas novidades que, a avançar, só estará operacional em finais de 2009;

- Por fim, complementando os abates de embarcações e resolvendo eventuais resistências, incentiva-se o abandono da actividade, sendo significativo que se avance com medidas que visam a saída e a reforma antecipada dos pescadores e dos trabalhadores do sector (lotas, serviços portuários, etc.), designadamente, "para prover as dificuldades surgidas com os encerramentos e as concentrações em consequência da diminuição das actividades piscatórias". 

É necessária outra política!
Assegurar o rendimento dos pescadores e o futuro das pescas

Os deputados do PCP no PE, consideram que o conjunto de medidas proposto pela Comissão Europeia e agora acordado ao nível do Conselho, no essencial, se inscreve e reafirma uma Política Comum de Pescas (PCP) que utiliza o agravamento da situação socio-económica deste sector (nomeadamente, devido ao aumento do preço dos combustíveis), como factor para incentivar, ainda mais, o abate de embarcações e a redução da capacidade de pesca, independentemente da diversidade de frotas, da realidade do sector e do padrão e necessidades de consumo em cada país.

Apesar de integrar alguns aspectos e medidas que, se aplicados, poderiam melhorar temporariamente a situação do sector das pescas (ajudas "de minimis", redução das contribuições para a segurança social aplicáveis aos pescadores, embora com um período máximo de dois anos, entre outras), o cerne das propostas apresenta como falsa solução, para o actual agravamento da situação socio-económica do sector, o "menos esforço de pesca" e a "adequação da frota", ou seja, o reforço, a facilitação, a aceleração e a concentração em 2009 e 2010 da cessação definitiva da actividade das embarcações, política que vêm sendo prosseguida ao longo dos anos.

Isto é, não existem recursos financeiros para coordenar e implementar medidas que ajudem o sector a fazer face ao aumento dos custos dos combustíveis, mas já existem muitas centenas de milhões de euros para promover o abate de embarcações.

Sendo necessário encontrar alternativas à utilização do gasóleo e gasolina é, no entanto, imprescindível apoiar este sector económico, um dos mais atingidos pelo aumento do preço dos combustíveis, até que estas se criem e sejam aplicáveis. Sendo, óbvio, que se deve promover uma exploração sustentável dos recursos haliêuticos, consideramos, no entanto, que esta não deverá ser feita através e à custa da destruição (cega) de grande parte deste sector estratégico. Ou seja, estes legítimos objectivos e obvias necessidades não podem ser utilizados para escamotear as reais e principais causas da agudização da situação socio-económica do sector, isto é, o aumento do preço dos combustíveis (gasolina e gasóleo) e a inadequada formação do preço do pescado em primeira venda.

Contudo, relativamente ao preço do gasóleo e da gasolina e à formação do preço do pescado na primeira venda (que valorize os preços na produção, sem aumentar os preços no consumidor), questões para as quais haverá que encontrar soluções para que se garanta a sustentabilidade do sector e do abastecimento público de pescado, nenhuma medida é avançada ao nível comunitário.

Mesmo as medidas que se diz serem dirigidas à melhoria dos preços no pescador, evitam intervir na formação do preço do pescado em primeira venda, não garantindo uma justa e adequada distribuição do valor acrescentado pela cadeia de valor do sector.

No essencial, as medidas agora avançadas são inadequadas porque não dão resposta às necessidades com que a esmagadora maioria do sector das pescas se confronta e, se forem implementadas em coerência com os objectivos claramente explicitados pela Comissão Europeia, criarão mais desemprego e agravarão as balanças alimentares e comerciais de países, como Portugal.

Os deputados do PCP no PE, reafirmando o seu empenhamento na defesa deste sector produtivo estratégico da economia nacional e, no seguimento das posições assumidas aquando do debate e votação desta proposta em sessão plenária do PE, rejeitam esta política de promoção do abandono desta actividade económica, que contribui para agravar a situação socio-económica das comunidades piscatórias.

[1] Os 2 mil milhões de euros têm origem nas seguintes fontes de financiamento: cerca de 600 milhões de euros do actual eixo 1 do FEP, mais 250 milhões de euros do co-financiamento de cada país e 550 milhões da reprogramação dos programas operacionais do FEP - o que perfaz 1,4 mil milhões. Os 600 milhões que poderão ou não vir a ser disponibilizados para além das verbas actualmente inscritas no FEP, poderão ser financiados a partir de verbas não utilizadas na rubrica 2 do orçamento comunitário, onde se inclui a PAC e a PCP, em 2009 e 2010, mas de forma condicionada.